Há um espaço tranquilo e bucólico, perto da albufeira de Castelo do Bode, na Serra de Tomar, onde foi criado um “spa para a mente” e onde se procuram as melhores soluções do ponto de vista ambiental para a sustentabilidade do planeta. O Creative Optimism Project (Projeto de Criatividade Otimista) é a concretização do sonho de Leyla Acaroglu, uma designer australiana que trabalhou em Nova Iorque mas que, depois de um “burnout” (esgotamento), decidiu mudar de vida e transformar o mundo a partir de uma quinta em Portugal.
Chega até nós de chapéu de palha na cabeça, camisa e calças de ganga e com um sorriso aberto. Leyla Acaroglu, designer australiana de 35 anos e ativista acérrima da sustentabilidade, viaja por todo o mundo a dar conferências.
É numa quinta de um hectare, na pacata aldeia de Figueira Redonda (Serra-Junceira), que desenvolve um projeto sem fins lucrativos: o CO Project – Creative Optimism Project (Projeto de Criatividade Otimista), pretende ser uma espécie de spa para a mente criativa, ajudando também a encontrar as melhores soluções para a sustentabilidade do planeta.
No site do projeto, Leyla vai divulgando os workshops e residências que promove ao longo do ano. No seu Brain Spa (spa do cérebro) é possível “recarregar os neurónios”, garante. “Tantos criativos esgotados tentam recuperar a sua energia trabalhando o corpo (e quem não gosta de uma longa massagem?), mas muitas vezes é o nosso cérebro que precisa de recarga e isso é possível através da reflexão, conexão e criatividade”, explica.
“O Brain Spa é um espaço para a regeneração da mente, na natureza, com pessoas incríveis, alimentos nutritivos e a aprendizagem necessária para poder regressar à vida diária de forma produtiva e transformadora.”
O Brain Spa é um espaço para a regeneração da mente, na natureza, com pessoas incríveis, alimentos nutritivos e a aprendizagem necessária para poder regressar à vida diária de forma produtiva e transformadora.
A quinta oferece também possibilidade de alojamento e procura dar igualmente a conhecer formas alternativas de trabalhar a terra. “Temos todos os recursos ao nosso alcance e penso que a minha geração vai ter que recuperar a agricultura biológica porque já ninguém quer comer comida com pesticidas. É muito recompensador e quero ver mais pessoas envolvidas neste desafio”, refere.
E como chegou Leyla a Tomar? “Visitei Portugal há uns anos e gostei muito dos portugueses e da sua cultura. Quando vi este local na Internet, achei que era o ideal para a minha visão. Foi o sítio que me escolheu”, explica numa entrevista em inglês, apesar de já conhecer algumas palavras em português. Neste vídeo, conduz-nos por uma visita guiada à sua quinta (agora já quase totalmente recuperada) e partilha um pouco do que pretende desenvolver no futuro.
Leyla descobriu aos 19 anos que a sua missão passaria por ajudar a tornar o mundo num local melhor para todos. “Era apaixonada por direitos humanos e por causas ambientais. E apercebi-me que, se queria ver as coisas feitas, teria que ser eu a fazê-las e não apenas esperar que alguém as fizesse. Só temos de dar o nosso exemplo”, sustenta, acrescentando que cada um de nós, mesmo de forma isolada, pode criar um impacto positivo no outro e no mundo.
Com o CO Project, pretende promover a noção de que está na mão de cada um contribuir para a sustentabilidade do planeta – ela ajuda a desenvolver as ideias de quem a procurar.
“Queremos que as pessoas se apercebam que têm as ferramentas necessárias para ajudar a mudar o mundo”, refere, dando o exemplo de uma hospedeira de bordo que chegou a Tomar para desenvolver uma ideia para acabar com o plástico nos aviões.
Já sabemos há muito tempo como destruímos o ecossistema, diz: agora é a altura de ter uma atitude construtiva. “Temos que contribuir para o futuro no qual queremos viver. Eu quero que a minha vida seja mais do que comprar coisas e ir trabalhar… Quero deixar a Terra melhor do que estava quando eu nasci”, frisa Leyla.
Já sabemos há muito tempo como destruímos o ecossistema, diz: agora é a altura de ter uma atitude construtiva. “Temos que contribuir para o futuro no qual queremos viver.
Designer de formação, Leyla conta que aos 19 anos leu algo que a deixou com uma visão diferente do mundo. “Lembro-me de ter chorado após ter lido que todos estamos ligados ao planeta. E, quando damos conta, faz mesmo tudo sentido. Passei os três anos seguintes a ler, a pesquisar e a refletir sobre estas questões”, confidencia, acrescentando que corre muitos riscos e bate a muitas portas.
“Não me importo de correr riscos porque se correr mal sou eu que limpo a porcaria”, ironiza. Conta ainda que tinha uma vida cliché em Nova Iorque quando se sentiu ‘stressada’, esgotada e infeliz. Decidiu ter uma conversa consigo própria, chegando à conclusão que devia comprar uma quinta num país estrangeiro e mudar-se para lá. Contrariamente ao que esperava, a família e os amigos apoiaram-na.
Quando lhe perguntamos como chegou até aqui e qual o segredo do seu sucesso, Leyla não hesita na resposta: com muito trabalho duro. A australiana conta que já falhou muito, mas por ter tentado muito. Bateu a muitas portas, dormiu por vezes onde calhou, esperou horas por uma reunião importante.
“Penso que descobri uma paixão, tornei-me boa nisso, aprendo imenso e trabalho arduamente. Durante 15 anos, aproveitei todas as oportunidades que surgiram e entreguei-me apaixonadamente”, refere, acrescentando que o que é importante é manter a integridade.
No Creative Optimism Project há workshops variados e ainda Campos Criativos (Creative Camps) para ajudar a ligar as pessoas à natureza. Este primeiro ano de trabalhos é mais experimental mas, este ano 2019, haverá um calendário de atividades mais estruturado, explica. O objetivo passa também por ensinar a cozinhar comida vegetariana.
Na horta de Leyla todos os produtos são biológicos. Os animais que por ali se veem (patos, cabras e até um burrito) têm apenas a função de ajudar a fertilizar os solos. A chuva e o sol fazem o resto.
“Somos as coisas que compramos e que comemos. A questão da alimentação é muito sensível para mim. Gostava que as pessoas respeitassem mais a natureza e os animais. Os humanos acham que têm o direito de torturar os animais para fazerem deles comida mas até as minhas galinhas têm consciência”, defende esta vegetariana por amor aos animais.
Todos os meses decorre um Open Day (Dia Aberto) permitindo a quem marcar previamente ficar a conhecer o projeto. O COP destina-se a todas as pessoas, independentemente da sua origem, profissão ou idade. Trata-se de “aprender com os melhores” para depois aplicar no mundo a sua ideia sustentável.
Não acho que nada seja impossível. Não tenho poderes especiais, a não ser estar apaixonada por uma missão e trabalhar muito para concretizá-la.
“Não gosto quando dizem que o futuro está nas mãos das crianças. São os adultos que têm o dinheiro e o poder para mudarem o estado das coisas”, defende. Leyla quer ajudar a desenhar um futuro melhor para todos, lembrando que somos seres criativos e temos o poder de criar esse mundo.
“Não acho que nada seja impossível. Não tenho poderes especiais, a não ser estar apaixonada por uma missão e trabalhar muito para concretizá-la. E agora sou convidada para falar em todo o mundo”, reflete. Das Nações Unidas às Conferências TED, Leyla Acaroglu já conhece todos os palcos.
Ela será, em última instância, o exemplo concreto da teoria que professa: “Uma pessoa não pode mudar o mundo… mas se muitas ajudarem, o mundo muda.”
*Publicada em agosto de 2018, republicada em janeiro de 2019