*reportagem publicada em junho 2016
A praia fluvial do Agroal, cuja nascente do rio Nabão separa os concelhos de Ourém e Tomar, é hoje apenas uma miragem das estruturas e paisagem insalubres que os banhistas se habituaram ali a encontrar nos finais do século passado. Recuperada a piscina, os edifícios e a imagem da própria unidade hoteleira ali presente há cerca de uma década, foram-se resolvendo nos últimos anos os problemas que subsistiam, como o estacionamento e a recolha do lixo. A rede de telemóvel da Vodafone está mais forte e apesar de uma contaminação ter prejudicado as análises à água em 2013, esta permanece própria para banhos. Água “milagrosa” para quem tem problemas de pele, o Agroal parece estar hoje finalmente preparado para receber turistas. A Época Balnear arranca a 1 de julho, sexta-feira.
Há dois caminhos: por Formigais, no concelho de Ourém, ou pela Sabacheira, no concelho de Tomar. De um lado percorre-se o rio, pelo outro desce-se a serra. Da margem de Tomar há a particularidade de se possuir um vista afunilada, em cova, para toda a praia fluvial, o que resulta em fotografias artísticas para os mais apaixonados. Do lado de Ourém há o centro de interpretação e os percursos pedestres que passam à beira rio, ideias para os amantes das caminhadas. Ao longo dos últimos anos de requalificação o Agroal só não conseguiu resolver com eficiência o problema dos carros. Um parque de estacionamento foi construído a cerca de um quilómetro da praia, no Centro de Interpretação, mas a distância é demasiado longa para quem traz crianças ou idosos e algo torturante para quem percorre o caminho com mais de 30 grau de calor.
Na tarde de domingo, 25 de junho, a poucos dias do arranque da época balnear, o mediotejo.net quis ir redescobrir o Agroal. Fez o percurso por Tomar, a poucos quilómetros da saída do IC9, e procurou o caminho pela serra. Do lado de Ourém as tabuletas castanhas que indicam a localização da praia fluvial são facilmente encontradas a partir da saída da sede do concelho. Já a cidade dos templários não possui tanta sinalização e o corte para o Agroal passa por localidade e não por ponto turístico.
Percorre-se a serra, onde rebentam os novos eucaliptos depois de anos de terríveis incêndios, e procura-se a descida íngreme que conduz ao rio e à margem esquerda, já em Ourém. Por este caminho, o Agroal fica logo depois da localidade de Suímo e, no geral, encontram-se mais povoações que no percurso do concelho de Ourém, mais preenchido de campos e vegetação. Descobrimos que estamos a chegar quando vemos os carros, em fila, serra acima, deixando estreita a passagem para quem quer descer a encosta em direção à praia. Bem junto à berma, a cova é funda e assusta a quem olha para baixo. Passa um autocarro, lentamente. Ultrapassamos sem sabermos bem como fará ele a curva no cimo do monte, em direção a Suímo. O calor ultrapassa os 30 graus, no interior do Médio Tejo, e a praia está à pinha.
A intervenção de requalificação resumiu-se quase completamente a Ourém. Do lado de Tomar permanece a praia de gravilha, bem junto à margem do rio, como as praias que se encontram por estes dias em Ferreira do Zêzere e Abrantes, e alguma ordenação do estacionamento e da recolha do lixo. No pico do verão uma roloute de farturas costuma estacionar neste lado do rio, mas nesta tarde de domingo ainda não fez a sua aparição. Talvez por isso não se veja lixo acumulado, apenas algum caos de automóveis e uma circulação titubeante, a passo.
Há quem prefira esta margem. Mais próxima do rio, mais sombras sob as árvores, um pouco mais selvagem e próxima da natureza, mais íntima. Nós passamos para o outro lado, vendo a fila de carros seguir-se e a assumir contornos de estacionamento invasivo, mas ainda assim respeitando alguma sinalização de proibição que ali foi colocada para permitir a circulação em picos de afluência. Ainda procuramos o parque do Centro de Interpretação, mas com o calor a apertar este torna-se demasiado longe. De resto, está praticamente vazio. Regressamos e deixamos o carro no final da fila, um pouco mais próximo da praia, e à sombra.
É um percurso que se faz desviando dos automóveis a querer estacionar, ao redor do recinto que dá as boas vindas à praia. Aí apenas entram bicicletas e automóveis de locais. Segundo informação do município, a época balnear arranque esta sexta-feira, 1 de julho, até 15 de setembro, devendo ter vigilância com nadadores salvadores. “Informamos ainda que aos fins de semana e feriados dentro do período referido estará uma ambulância e respetiva equipa de bombeiros para reforço do contingente de socorro”, sublinha. O Agroal, por isso, ainda está a meio gás. Duas senhoras montaram a barraca e vendem desde biquinis e t-shirts da seleção nacional a tremoços e bolos secos de amêndoa.
“- Quanto custa?”
“- 1,30€!”
“- Tão caro?!”
“- Estou a vendê-los mais barato que noutros sítios…”
“- Comprei igual em São Pedro de Moel por 1€…”
“- Estes vieram da Nazaré…”
Debate-se o preço do doce. Na barraca ao lado, quadros com fotografias do Agroal de outros tempos, com casas multicolores evidenciando ruína e taipais em redor do tanque que compõe a nascente, no lado de Ourém. Mato em volta. Uma senhora aproxima-se e constata a mudança. Aquele Agroal nada tem a ver com o que se encontra hoje, arranjado, com alguns espaços verdes, contentores do lixo, balneários e a evidência de que foi alvo de uma recente limpeza. Há casas para alugar com a estrutura recuperada e o próprio restaurante/café e pavilhão anexo hoje exibem uma cor branca. A cafetaria do município de Ourém ainda está encerrada e não se veem nadadores salvadores.
A água permanece imprópria para consumo. A placa a avisar é visível, mas ainda assim passam pessoas com garrafões de cinco litros de água, bem cheios. Há quem afirme que aquela água gélida faz milagres à pele, nomeadamente de quem sofre de psoríase. Das dezenas de turistas que se banham, facilmente se verifica que alguns estão ali a tentar aliviar as manchas e eczemas do corpo.
Visível também é o placard com as análises à água realizadas desde 2009, com a evidência de uma contaminação verificada nesse ano, que deu azo a 2013 a uma classificação da praia como Má. As avaliações da Quercus exigem água excelente durante cinco anos seguidos, pelo que o Agroal permanece fora das listas de Qualidade de Ouro. Ainda assim, os registos online da Agência Portuguesa do Ambiente dão a água como própria para banhos e não há informação na praia de que as pessoas não se devam banhar. Alertas há sim para que não se atirem, de salto, para dentro da piscina, aviso que a maioria dos adolescentes tende a ignorar e que uma senhora idosa chama nervosamente à atenção, sem sucesso.
A água está limpa, o sol está quente. No único restaurante local, a esplanada e o interior estão cheios, não se vendo um lugar vazio. Comem-se caracóis, conforme aviso logo à entrada da existência do pitéu, e abre-se constantemente a arca dos gelados. António Pardal, gerente da Sociedade Hoteleira das Termas do Agroal, comenta que não almoçou e evidencia a adrenalina provocada pela ausência de descanso. Posteriormente refere ao mediotejo.net que este não foi o primeiro dia agitado do ano, havendo sempre movimento quando surge o sol. Antecipou-se sim a limpeza do espaço da praia, que costuma ser mais tardia, razão pela qual esta se encontrava tão limpa.
No fundo de uma cova, rodeado de serra, o Agroal tem tido desde sempre problemas com a rede de telemóvel. Bem se aproximando do local, esta deixa de existir. Curiosamente o telemóvel Vodafone da jornalista permaneceu com rede toda a tarde. António Pardal explica que o sinal foi amplificado e está mais forte, não estando a funcionar contudo ainda em pleno. O problema, comenta, deverá ser resolvido este ano, em conjugação com os municípios que envolvem a praia.
Procura-se um lugar à sombra e observa-se a paisagem. A piscina junto à nascente está cheia. A água sai gélida e é preciso uma boa dose de preparação psicológica para se entrar dentro dela. Alguns atiram-se, não têm medo. A água transborda a estrutura e segue o seu curso normal pelo rio Nabão, onde outros banhistas preferem deliciar-se ou apanhar os pequenos peixes. Com um deque de madeira instalado junto aos balneários, por baixo da Cafetaria do município, é hoje usual aí se deitarem as pessoas nas toalhas, usufruindo da sombra criada e evitando as moscas e as formigas que atacam a quem procura a relva ou a terra. Não se vê lixo e os baldes para o efeito também não estão cheios. Há quem monte tendas, outros trazem apenas toalhas, um jovem passa com um prancha de bodyboard.
Cheira à frescura do rio e ouvem-se as cigarras, delirantes, a cantar o forte calor. O Agroal parece finalmente preparado para receber turistas.
Cláudia Gameiro, 32 anos, há nove a tentar entender o mundo com o olhar de jornalista. Navegando entre dois distritos, sempre com Fátima no horizonte, à descoberta de novos lugares. Não lhe peçam que fale, desenrasca-se melhor na escrita
Hei de ir até lá, quero ver.